JACOB DO BANDOLIM, O INCANSÁVEL PESQUISADOR

PRIMEIRA PARTE

Noites Cariocas (Jacob do Bandolim) Dudu Maia e Regional

INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA

Jacob Pick Bittencourt  nasceu em 14/02/1918 no Rio. Era filho de Francisco Gomes Bittencourt e Sara Raquel Pick, uma judia polonesa que havia vindo como imigrante para o Brasil. Morou durante a infância no bairro da Lapa. Quando criança, Jacob gostava de ouvir um vizinho francês e cego tocar violino. Gostaria também de ter um instrumento e aos 12 anos ganhou de sua mãe um violino. Porém não se adaptou e começou a tocá-lo usando grampos de cabelo de sua mãe. Logo depois, conseguiu seu primeiro bandolim. Repetia então, no bandolim trechos de melodias que ouvia de sua mãe e de pessoas que passavam na rua. Não tinha amigos; tinha uma cachorro, ia à escola e tocava bandolim. Estudava sozinho no seu instrumento. Contudo, em relação aos estudos regulares, estudou nos melhores colégios: Marechal Deodoro da Fonseca, Colégio Cruzeiro – escola referência da comunidade alemã, e Colégio Anglo Americano.

JACOB, UM AUTODIDATA

Quanto à musica apesar de não ter tido uma formação musical formal, sua paixão e talento levaram-no a aprofundar seus conhecimentos, por meio de sua observação e de suas buscas. Seu primeiro instrumento foi uma gaita, depois o violino, em seguida o bandolim. Passava horas estudando e criando técnicas próprias no seu instrumento. Com 13 anos ouviu seu primeiro choro, tocado no prédio em frente a sua casa. A música era ‘É Do Que Há‘, composta por Luiz Americano. Ele disse certa vez: _”Nunca mais esqueci a impressão que me causou”. Em 20 de dezembro de 1933, se apresentou pela primeira vez na Radio Guanabara, ainda como amador, com o Conjunto Sereno, formado por amigos. Tocaram então, o choro ‘Aguenta Calunga‘, de autoria de Atílio Grany. Porém Jacob, que nessa época ainda tocava de ouvido, não gostou de seu desempenho e decidiu praticar ainda mais.

OPORTUNIDADES

Jacob gostava de visitar as lojas que vendiam artigos musicais e lá ficava a experimentar o som dos instrumentos. Um dia, um senhor que tinha ido consertar o violão numa dessas lojas, ouviu Jacob tocar e se interessou. Deu-lhe um cartão e convidou-o para que fosse a Radio Phillips. Quando Jacob leu o cartão, ficou atônito. O convite era feito pelo Luiz Americano, clarinetista, compositor do primeiro choro que  tinha ouvido da janela de sua casa. Jacob chegou a ir com um amigo até a porta da emissora porém, talvez por não se sentir ainda preparado, desistiu de se apresentar e rasgou o cartão. Apenas mais tarde ao se sentir mais confiante, Jacob iniciou sua carreira no rádio em maio de 1934, Programa dos NovosRádio Guanabara. O programa contava com um júri rigoroso e Jacob saiu vencedor, disputando com outros 28 concorrentes e recebendo nota máxima do júri.

CARREIRA MUSICAL

Jacob com muita criatividade introduziu ao Choro outros instrumentos não usuais no gênero: a sanfona e o vibrafone; acabou assim modernizando o choro. Compôs clássicos do choro como ‘Vibrações, ‘Doce de Coco‘, ‘Noites Cariocas‘,  ‘Assanhado‘ e ‘Receita de Samba‘. Montou o ‘Conjunto Época de Ouro’.  Tornou-se um virtuoso no bandolim e destacou-se além de compositor como arranjador; acabou ficando reconhecido por sua técnica refinada e a influência que imprimiu na música brasileira. Em 1968 houve um espetáculo no Teatro João Caetano em benefício do Museu da Imagem e do Som; marcante foi a participação de Jacob do Bandolim, Elizeth CardosoZimbo Trio e o Conjunto Época de Ouro. A apresentação de Jacob tocando a música ‘Chega de Saudade‘ com Tom Jobim e Vinícius de Moraes foi antológica. ( Veja Post de Vinícius de Moraes neste Blog clicando no link: https://conclavedesol.mastermusica.com.br/vinicius-de-moraes-o-poetinha-e-o-diplomata).

JACOB DO BANDOLIM, O INCANSÁVEL PESQUISADOR

O NOME DO INSTRUMENTO QUE VIROU UM SOBRENOME

Jacob Pick Bitrtencourt, tinha então uma carreira reconhecida pelo seu virtuosismo no instrumento que escolhera; durante uma transmissão de rádio na década de 1930 recebeu do compositor e radialista César de Alencar o apelido de JACOB DO BANDOLIM. O nome do instrumento acabou virando o seu sobrenome. César de Alencar, foi um compositor, radialista e jornalista brasileiro. Ele desempenhou um papel significativo na música popular brasileira, sendo conhecido por sua atuação como divulgador e incentivador de artistas. Além disso, César de Alencar teve uma longa carreira, atuando em diversas emissoras de rádio no Rio de Janeiro. Ele contribuiu para a divulgação de vários gêneros musicais, incluindo o choro, e teve participação importante na cena cultural da época.

LIVROS SOBRE JACOB DO BANDOLIM

Gonçalo Júnior é o autor do livro ‘JACOB DO BANDOLIM – UM CORAÇÃO QUE CHORA’; ele relata na sua obra a personalidade controversa e irascível de Jacob, além, claro, do talento inegável do músico. Para isso, dedicou intensamente dois anos ininterruptos de pesquisa. Poré antes já vinha juntando, material sobre Jacob. Cheio de manias e muito brigão, o músico rendia ótimas histórias engraçadas. Outro escritor Henrique Cazes escreveu o livro ‘ CHORO – DO QUINTAL AO MUNICIPAL’ (Editora 34). Ele diz: “Se eu tivesse que apontar uma data para o início da história do choro, não hesitaria em dar o mês de julho de 1845, quando a polca foi dançada pela primeira vez no Teatro São Pedro”. Querendo dizer com isso, que, da Europa veio esse DNA do Jacob- herança da Mãe, mas também da polca da qual se originou o choro; a polca tinha vindo de uma dança européia de origem Austro-Húngara.

A INTOLERÂNCIA COM A BOSSA NOVA E COM O JAZZ

Jacob enfrentava sérios embates contra a música popular que fazia concorrência ao choro, do qual Jacob era um dos maiores nomes. Tinha uma intensa birra com com a bossa nova. Tinha uma implicância com o Jazz. Ele não admitia a ‘jazzificação’ do samba. Reclamava das longas improvisações do jazz. Porém fazia algo bem incoerente também: Jacob era o cara da improvisação do choro. Gonçalo Junior em seu livro fala sobre isso. Porém Jacob dizia que a ‘Bossa Nova‘ tinha um lado bem positivo; havia tirado centenas ou milhares de rapazes do mundo do crime porque, em vez de comprarem armas, eles compravam um violão e ficavam em casa tocando.

JACOB DO BANDOLIM, O INCANSÁVEL PESQUISADOR

JACOB também era um incansável pesquisador; pesquisou, resgatou e preservou as obras de vários mestres, tais como Ernesto Nazareth, Candinho do Trombone e João Pernambuco. Gravava em rolos magnéticos; recortava jornais; recolhia partituras e cadernos de choro; colecionava discos, inclusive, os feitos de cera (discos de 78 rotações, feitos de goma-laca que cairam em desuso com o advento dos discos de vinil na décadas de 1970); em suma, ele se preocupou com a preservação de nossa cultura musical. Jacob era fotógrafo e dominava a técnica de revelação fotográfica; dessa forma, chegou a microfilmar milhares de partituras. Jacob passava as madrugadas cuidando desse tesouro. Conseguiu reunir milhares de peças, incluindo discos, partituras, fotos e matérias jornalísticas; esse acervo, ficou conhecido como “O Arquivo do Jacob”, e faz parte do acervo do Museu da Imagem e do Som/RJ. Tem perto de 10.000 ítens entre ítens sonoros, partituras e manuscritos.

CASAMENTO E FILHOS

Aos 22 anos, conheceu uma jovem e se apaixonou. Havia porém um impecilho. Ele era de família judia e ela era católica. E os pais dela só concordariam com o casamento, se ele se convertesse ao catolicismo. Tinha que enfrentar a mãe que certamente seria contra. Mas os pais da jovem não abriram mão e ele cedeu. Converteu-se e se batizou. Em seguida casou-se na Igreja católica com Adylia Freitas que foi sua companheira de toda vida. Tiveram os filhos Sérgio que se tornou um polêmico jornalista e compositor; ele era hemofílico (Doença que altera a coagulação do sangue dificultando o controle do sangramentoi e causandio hemorragias prolongadas; e Elena, cirurgiã-dentista; ela fundou e presidiu o Instituto Jacob do Bandolim, para preservar a pesquisa do Pai. Sérgio Bittecourt devido a sua doença faleceu com apenas 38 anos em 1979. Elena Bittencourt, cirurgiã dentista, faleceu em 2011.

JACOB, SERVENTUÁRIO DE JUSTIÇA

Jacob foi aconselhado por Pixinguinha a fazer um concurso para Serventuário de Justiça. Ele se preparou e fez o concurso. Trabalhou no arquivo do Ministério da Guerra e por fim, Jacob fez carreira como serventuário da justiça no Rio de janeiro trabalhando como escrivão de uma vara criminal da capital. Paralelamente cercou-se de exímios instrumentistas, como César Faria, pai do compositor Paulinho da Viola, seu fiel escudeiro pelas décadas seguintes. Formou um grupo ‘Jacob e sua Gente‘ se revezava nas rádios e gravadoras com o regional de Benedito Lacerda –’Gente do morro’, o mais renomado da época – no acompanhamento dos principais cantores da época. Com o sucesso na Rádio Guanabara Jacob passou a ser presença comum nos programas de rádio. Ganhava cachê se apresentando em diversas rádios: Rádio Tupi, Rádio Fluminense, Rádio Cajuti, Rádio Transmissora, Rádio Globo, Rádio Marynk Veiga; na Rádio Mauá fazia um programa exclusivamente seu.

JACOB, O HIPOCONDRÍACO

Jacob era acentuadamente hipocondráiaco; usava muitos remédios e expunha nas paredes de sua casa uma lista de doenças. Chegou até a fazer uma coisa incrível: aos 26 anos de idade, disseram a ele que a boca era muito sensível a bactérias e doenças. Ele então, mandou arrancar todos os dentes e colocou uma dentadura no lugar’. Gonçalo Junior conta também no seu livro: ‘Jacob é o que se pode chamar de figuraça. Era temperamental, brigão e hipocondríaco. Além disso, tinha manias bem particulares: acordava as 6h, tomava um café com bolo e logo às 7h almoçava, para depois ir ao trabalho, na justiça criminal, onde era escrivão.’

JACOB FALA DE SUA ARTE

MORTE

O grande compositor Jacob do Bandolim passou sua última tarde, no Bairro de Ramos, em visita a seu grande amigo compositor e maestro Pixinguinha. Eles tinham começado a planejar um novo disco. Já vinha muito doente, fumava muito, estava já debilitado e ao chegar à varanda da sua casa, cansado e esbaforido, caiu nos braços de sua esposa Adylia, já sem vida. Jacob morreu em 13 de agosto de 1969, aos 51 anos, tendo sofrido novamente um infarto cardíaco.

Vibrações’ por Jacob do Bandolim

SERGIO BITTENCOURT, SEU FILHO

Sérgio Bittencourt, filho de Jacob do Bandolim, seguindo a carreira do Pai tornou-se músico também. Escrevia de forma dura e desaforada, contudo era um sentimentalista. Pai e Filho tinham um relacionamento difícil; consta que fizeram as pazes quando o pai teve o primeiro infarto em março de 1967. Com a morte do pai, porém Sérgio ficou muito abalado. Conta-se que ele na mesma noite da partida do pai, Sérgio pegando apressadamente um guardanapo, escreveu nele mesmo, a letra da música ‘Naquela Mesa‘. Fez sucesso na voz de Elizeth Cardoso e depois Nelson Gonçalves. Houve um fato marcante dessa dificuldade de relacionamento; Sergio engravidou uma jovem e não queria assumir, porém Jacob o obrigou a viver com a mulher. Sergio só se sentava à mesa depois que o pai se levantava, só melhorando o relacionamento nos últimos anos.

Abaixo Danilo Brito relata sobre a convivência entre Pai e Filho ressaltando a beleza e a emoção que transparecem na letra da canção.

Naquela Mesa (Sergio Bittencourt) – interpretação de Raimundo José, Danilo Brito(bandolin) , Carlos Moura( violão) e Xeina Barros (Pandeiro)

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